Como uma aplicação prática do conceito de Ecossistema de Educação Digital, este autor elaborou pré-projeto para criar ambiente híbrido para melhoria de processos empresariais.
Introdução à problemática do projeto
Frequentemente, como uma das formas de evolução de sua gestão empresarial, organizações se transformam de uma estrutura estritamente hierárquica, departamental, para uma estrutura mista com uma cadeia de valor formada por processos. Nesses casos, é de se esperar um esforço de melhoria contínua dos desempenhos desses processos, visando aumentar seus resultados.
Isto é feito por técnicas próprias, com a realização de análises das atividades dos processos, comparação de indicadores com metas planejadas e tratamento das lacunas de desempenho que aparecem, visando diminuí-las ou eliminá-las. Os cursos superiores capacitam seus alunos na elaboração de projetos de melhoria para aplicar essas técnicas, estruturados em equipes que elaboram de planos de ação.
Esses projetos enfrentam a resistência dos executores das atividades e de seus gestores, pois são muito demorados, vagarosos, caros e de resultados incertos, por causa de muitos deslocamentos de pessoas, longas reuniões com impacto nas rotinas de trabalho, entre outros, o que muitas vezes, na prática, inviabiliza a aplicação dos métodos ensinados nos cursos tradicionais e frustra os próprios egressos dos cursos superiores que os aplicam.
O que ocorre é que esses projetos vêm sendo conduzidos, desde meados do século passado, da mesma forma analógica, enquadrados por métodos rígidos, apoiados apenas por ferramentas digitais stand alone básicas. Metodologias ativas já substituem algumas atividades e consultorias aplicam métodos rápidos, como o Design Sprint do Google, em alguns casos, mas isso é pouco para uma sociedade que já está conectada em rede em grande parte de seus afazeres e cujas organizações estão cada vez mais pressionadas por seus clientes para melhorar continuamente seus serviços.
Esta situação já produz reflexos nos alunos dentro das universidades, usuários diuturnos das novas tecnologias, se ressentem de utilizar práticas antiquadas e, muitas vezes, já estão em contato com a ausência de inovação dos métodos, em estágios profissionais de algumas organizações, e percebem o descontentamento dos seus funcionários.
O ensino superior pode e deve ser vanguarda, mas precisa enfrentar esta problemática da defasagem das soluções pedagógicas atuais dos cursos superiores, no que se refere ao ensino e prática das técnicas de melhoria dos processos nas organizações.
Identificação e descrição do problema de estudo
Para resolver um problema, (Miranda & Cabral, 2017) salientam que, antes de tudo, é necessária “a capacidade de o formular de modo claro e objetivo, apelando para processos cognitivos como a criatividade, o espírito de descoberta e a interpretação da realidade pressentida”, o que leva a considerar que uma reflexão sobre como moldar uma solução pedagógica para reduzir a problemática identificada, inclui o ambiente acadêmico com todas as suas possibilidades, o aluno de curso superior com suas competências digitais pessoais e as organizações em toda a sua diversidade de propósitos e recursos limitados. É necessário um modelo pedagógico muito flexível e abrangente.
O ecossistema de educação digital pode ser uma solução para o “Ensino de técnicas de melhoria de processos organizacionais a distância”, em que técnicas analógicas utilizando metodologias ativas podem ser utilizadas nos processos, onde eles realmente acontecem, misturadas a ambientes digitais em rede, funcionando numa lógica assíncrona, com fóruns para suporte à criação colaborativa, softwares abertos, e, principalmente, tudo integrado num processo pedagógico compreensivo, focado na apresentação e aplicação de métodos e técnicas de mercado, numa lógica de “aprender fazendo”.
A composição da problemática identificada, de atuação direta sobre os processos que acontecem nas organizações, e de execução em rede de atividades analógicas e digitais exigidas pelos métodos, mostra que o ecossistema imaginado reúne as características essenciais para um EAD, que se inclui como uma mais valia do projeto. Assim, a partir da problemática levantada e vislumbre de solução, identifica-se o problema: estruturar um ecossistema de educação digital capaz de abrigar uma solução pedagógica para o ensino e prática a distância de técnicas de melhoria de processos.
Diagnóstico que sustente a formulação do projeto
O ensino das técnicas de melhoria de processos está descolado das necessidades das organizações, que carecem de profissionais que, além das competências técnicas específicas necessárias às posições a que se candidatam, precisam de outras, também técnicas, mas de aplicação geral, como é o caso das técnicas de melhoria de processos, pois todos que trabalham em uma organização são participantes de vários processos e devem, no mínimo, contribuir para suas melhorias, frequentemente até tornando-se responsáveis pelos desempenhos de vários deles.
Tal descolamento é uma lacuna do ensino atual ora detectada, como pontuado em (Miranda & Cabral, 2017) quando relacionam “Identificar os problemas que estão presentes numa determinada realidade e qual o seu grau de importância” em primeiro lugar de sua lista, quanto à importância do diagnóstico, e tal lacuna pode e deve ser enfrentada com a intervenção representada por este projeto.
Para aprofundamento deste diagnóstico e refinamento deste pré-projeto serão necessários levantamentos adicionais de eventuais intervenções anteriores relacionadas à problemática, às expetativas e percepções dos atores diretamente envolvidos, como professores do ensino superior, especialmente das áreas diretamente relacionadas às disciplinas de gestão empresarial, alunos, administrações das universidades, consultorias especializadas e gestores empresariais.
Justificação do problema
O problema se justifica pela ausência de ambiente suficientemente flexível para levar adiante, de forma economicamente viável, projetos educacionais que abranjam ambientes onde os processos realmente acontecem e aqueles onde técnicos especializados dispõem dos melhores recursos tecnológicos para análises e aplicações de ferramentas para melhorias desses processos.
Referencial teórico (inicial) do projeto
O Design-based Research
E é um projeto a melhor forma de enfrentar o problema? A decisão de utilizar um projeto é sustentada pela ideia da Design-based Research, que “has high potential to aid in the development and assessment of innovations in education such as e-learning” (Anderson, 2005). É um tipo de investigação em que a intervenção educacional engloba trabalhar em problema prático, identificado por praticantes profissionais da área, o que é o caso.
As etapas do DBR são “informed exploration” que é a revisão de literatura para o design da intervenção, “enactment” que é a construção da intervenção, sua estruturação e detalhamento, “evaluation withina local context” que são medições qualitativas e quantitativas dos impactos desejados e indesejados da intervenção e “broader impact evaluation” que estuda a intervenção em múltiplos contextos para “teorizar” sobre seu impacto e melhorar o projeto para contextos maiores e mais gerais.
O Product Design: The Delft Design Approach
Será utilizada a abordagem Delft de design como método para a melhoria dos processos, porque ela encerra a moderna visão do designer na concepção do produto, com foco na perspectiva do cliente, o que está diretamente relacionado à experiência desse cliente na utilização do serviço, no caso deste projeto. A abordagem tem o propósito de ensinar a projetar, de forma empática com o cliente, um produto ou serviço que seja realmente útil e significativo, como se deseja para a prestação de serviço educacional EaD para capacitar alunos de cursos superiores a melhorar o desempenho de processos empresariais.
A Abordagem Delft é organizada em 4 fases: Discover: compreender propósito ou utilidade em design - entender como o que nos rodeia alcança seu propósito, sua utilidade, e como e por que projetar coisas que sejam realmente úteis, compreender o contexto de uso, como e por que ganhar o entendimento empático dos usuários para quem se projeta, como aproveitar insights para inspirar o processo de design. Define: definir um desafio para o design - como identificar o problema chave do projeto quando se olha para a situação atual do usuário, como definir um desafio significativo do projeto que irá orientar as fases criativas do design. Design: gerar ideias, desenvolver conceitos e testar com usuário - como gerar ideias, como filtrar ideias promissoras, o que é e como desenvolver um conceito de design, qual a função do Sketching, como avaliar conceitos e decidir entre eles, como testar suas qualidades chave, como apresentar o conceito. Deliver: apresentação final – como apresentar o trabalho.
A The Community of Inquiry - Garrison, Anderson e Archer
Um ecossistema de educação digital é justamente do que se necessita para a produção em equipe da melhoria de processos, em que a socialização dos debates para definir os melhores rumos dos trabalhos, a utilização conjunta de métodos, o consenso quanto a significados e o aprendizado coletivo, entrelaçados continuamente com a direção e o formato criativo e empático do design, são fatores de sucesso.
Segundo Wilkinson (2002) a arquitetura fundamental de um ecossistema digital de aprendizagem em rede inclui uma taxonomia de conteúdos partilhada, LMS- Learning Management Systems, LCMS- Learning Content Management Systems, repositórios de objetos de aprendizagem, workflow, motores de avaliação, motores de simulação e jogos, ferramentas de colaboração e discussão e elementos de suporte e orientação. A arquitetura do ecossistema será ajustada às necessidades específicas deste projeto pois, como nos explica (Moreira et al, 2020), a estrutura do ecossistema pode assumir qualquer tamanho, desde que comporte indivíduos da espécie humana (professores e estudantes),organismos da espécie digital (conteúdos), um ambiente digital (as tecnologias) e as interações entre os mesmos.
Importante ressaltar, ainda em (Moreira et al, 2020), a abordagem mais abrangente que a meramente digital, que inclui a arquitetura pedagógica do Modelo Pedagógico Virtual, composto dos aspectos organizacionais, metodológicos, tecnológicos e dos conteúdos, do qual o Community of Inquiry é representante e que será utilizado neste projeto.
O modelo integra as dimensões de presenças cognitiva, relacionada à construção e confirmação de significado pelos estudantes, social, à projeção social e emocional através da comunicação, e de ensino que é a direção, o design, a facilitação das outras duas para a realização dos resultados da aprendizagem.
2.4 Objetivos Gerais e Específicos do projeto
Os objetivos do projeto devem estar relacionados ao propósito que se pretende alcançar com o projeto. O objetivo geral deve transformar a situação atual na nova situação desejada, numa sequência lógica que percorre os objetivos específicos. Devem ser claros, escritos em linguagem precisa, realistas, possíveis de se alcançar com os meios disponíveis, congruentes, consistentes entre si, e pertinentes, com relação lógica ao problema. (Miranda & Cabral, 2017)
Objetivo geral: Criar um ecossistema de educação digital para o ensino e prática a distância de técnicas de melhoria de processos.
Objetivos específicos:
Selecionar o método de melhoria de processos a ser utilizado e ferramentas associadas;
Estruturar uma solução pedagógica no modo EAD para o ensino do método incluindo as capacitações no uso das ferramentas associadas;
Definir os recursos tecnológicos, os aspetos organizacionais e os conteúdos essenciais necessários para a implantação do ecossistema;
Implantar o ecossistema;
Realizar o piloto para a melhoria de 1 processo;
Avaliar o resultado do piloto.
Referência Bibliográficas
Anderson, T. (2005). Design-based Research and its Application to a Call Centre Innovation in Distance Education. Canadian Journal of Learning and Technology, Volume 31(2) Winter / hiver 2005.
Miranda & Cabral. (2017). Projetos de Intervenção Educativa.
Moreira, J.A. et al. (2020). Educação Digital em Rede: Princípios para o Design Pedagógico em Tempos de Pandemia. Universidade Aberta de Portugal. Lisboa, Portugal.
Wilkinson, D. L. (2002). The Intersection of Learning Architecture and Instructional Design in e-learning. In Proceedings of the 2002 eTEE e-Technologies in Engineering Education, Suíça, 213-220.
Luiz Leitão
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